Como fica a tributação de investimento no exterior?
A Medida Provisória n° 1.171 de 30 de abril de 2023 cria um novo regime para o cidadão brasileiro que possui ativos no exterior. Saiba o que mudou. A MP editada pelo Presidente da República não poderia ser mais simbólica. Adota o número 171 logo após o pronunciamento em rede nacional falando em pacote de bondades. Ao longo da campanha defendeu que o reajuste do salário mínimo e a correção da tabela do imposto de renda seriam implementadas em seu governo e que tais medidas não foram por seu antecessor por incompetência e/ou falta de vontade política. Ao assumir a cadeira percebeu que não havia orçamento para a concessão das bondades. O Ministro da Fazenda fez pronunciamentos que não haveria aumento da carga tributária para os projetos sociais. Eis que a MP 171 deixa claro que discurso político não combina com coerência, nem responsabilidade. Alguns simpatizantes do atual governo dirão que a “inclusão do pobre no orçamento” viria de recursos daqueles que “não são tributados atualmente”. As premissas são falsas e se alguém tiver interesse em debatê-las, deixo meus contatos em aberto, mas encerro aqui a crítica para ir direto ao ponto que interessa ao leitor: o que muda com a MP? O texto da MP estabelece que as disposições que instituem a tributação do investimento no exterior somente passarão a valer a partir de 1° de janeiro de 2024. Significa dizer que os fatos ocorridos até 31 de dezembro de 2023 estão fora do alcance das normas. Há uma discussão que surgirá sobre os eventos que ocorreram antes da vigência da norma, mas seus efeitos só serão refletidos no exercício seguinte, mas este é um tema para outro artigo. Se eu receber pedidos, prometo aprofundar o tema. 2. Conversão da MP em Lei Ordinária. Como a validade da MP está condicionada à sua conversão em Lei Ordinária pelo Congresso, o Governo precisa trabalhar para buscar consenso entre os parlamentares e aprovar antes que o ato normativo caduque. Se é verdade que a maioria do congresso não apoia o atual governo, não se pode deixar de reconhecer que foi uma jogada habilidosa. É feito um anúncio de atualização da tabela do Imposto de Renda que beneficia muitos cidadãos e se condiciona a concessão de tal “benefício” à tributação dos “mais ricos”. Caso o Congresso deixe de apreciar a MP no prazo, terá que absorver o custo político de não atualizar a tabela do imposto de renda para uma parcela expressiva de brasileiros. Vencidos estes dois tópicos iniciais, vamos ao exame da MP 171. 3. Tributação dos investimentos de forma separada dos demais rendimentos e ganho de capital. O artigo 2° da MP estabelece que os rendimentos aplicados no exterior serão apurados e tributados de forma separa dos rendimentos e ganho de capital experimentados no Brasil. Este dispositivo conflita com as normas vigentes no ordenamento jurídico que buscam harmonizar regras de tributação em países com os quais o Brasil tenha celebrado tratado ou possua acordo de reciprocidade. Significa que os esforços diplomáticos estabelecidos nos tratados para evitar a bitributação da renda foram solenemente desprezados pelo Presidente da República com a medida. Tem muito conflito que se estabelecerá a este respeito. 4. Apuração do Imposto de Renda dos investimentos no exterior. Segundo o texto da MP, o imposto de renda será apurado segundo a tabela progressiva nos seguintes termos: “Art. 2°. (…) § 1º Os rendimentos de que trata o caput ficarão sujeitos à incidência do IRPF, no ajuste anual, pelas seguintes alíquotas, não se aplicando nenhuma dedução da base de cálculo: I – 0% (zero por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que não ultrapassar R$ 6.000,00 (seis mil reais); II – 15% (quinze por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que exceder a R$ 6.000,00 (seis mil reais) e não ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); III – 22,5% (vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais)”. A MP mantém o regime de tributação do ganho de capital previsto no art. 21 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995. Então o caput estaria em contradição com o parágrafo 2°? Acredito que a intenção dos redatores do dispositivo seja permitir a tributação do investimento no exterior sem a possibilidade de compensar o prejuízo apurado em território brasileiro. Viabilizaria dessa forma que o Governo arrecade tributo ainda que o contribuinte não experimente “ganho” quando cotejado o resultado do investimento em solo brasileiro com o desempenho no exterior. É um grande equívoco! Sem dúvida merecerá discussão na via judicial. 5. Das entidades controladas no exterior e dos trusts. A MP busca permitir que a legislação brasileira alcance entidades sediadas no exterior que possam apurar resultado positivo, mas que segundo a legislação vigente não havia o reconhecimento no patrimônio da pessoa física residente e domiciliada no Brasil. Há uma série de inconsistências nas previsões legais ali contidas e que serão objeto de análise minuciosa em texto próprio. 6. Da atualização do valor dos bens para o “valor de mercado”. A MP admite que os brasileiros possam atualizar o valor dos bens detidos no exterior para o “valor de mercado” mediante o recolhimento do imposto de renda na proporção de 10% sobre a variação entre o valor que constava na sua declaração e o valor atualizado. A MP fala em atualizar para 31 de dezembro de 2022, fazendo constar na sua declaração de ajuste anual a ser entregue até 31 de maio de 2023 e o imposto deverá ser recolhido até 30 de novembro de 2023. 7. A atualização da tabela do imposto de renda. Finalmente, a MP apresenta a atualização da tabela do Imposto de Renda, ampliando a isenção para R$ 2.112,00. Esta tímida atualização, como dito, está condicionada à conversão da MP em Lei, mas os efeitos já serão produzidos sobre os rendimentos pagos ou creditados em maio de 2023. Como referi, foi criada uma armadilha para o Congresso aprovar a MP 171 repleta de equívocos e