Lançamento do Livro Tributação 4.0
Por Ederson Porto e Priscila Anselmini As contantes mudanças tecnológicas estão afetando o cotidiano da população mundial, integrando a dinâmica da sociedade de maneira irreversível. Os desafios que surgem também se tornam emergentes, necessitando receber contornos mais claros e precisos, sobretudo em matéria regulamentar e legislativa. Diante deste cenário, o Direito Tributário emerge como uma ferramenta para regulamentar o avanço tecnológico em frente a arrecadação do Estado Nação aos cofres públicos. Para tanto, o debate qualificado e a busca pelo conhecimento se tornam essenciais para compreender e definir os limites des- sa tributação, em face às novas tecnologias. É com esse intuito que a presente obra agrupou diversos pesquisadores qualificados sobre a temática, envolvendo a economia digital e os desafios para o Direito Tributário. A atenção às novas tecnologias, como criptomoedas, inteligência artificial, marketplaces e plataformas digitais passou de uma abordagem superficial para uma necessidade urgente em face da tributação, especialmente no âmbito nacional, em que se concentra em uma fiscalidade pautada nos espaços físicos e bens materiais. A tributação, neste sentido, desenvolve estima, tanto para a regulamentação, como para a arrecadação eficiente aos cofres públicos. O desenvolvimento tecnológico permitiu (permite e ainda permitirá) alcançar um nível elevado de benefícios para a população e para a sua qualidade de vida, com destaque para a medicina, agricultura, economia, indústria, in- ovação, informática, entre outros setores. Certamente, juntamente com os benefícios, haverá impactos negativos, uma vez que nem todas as nações possuem acesso amplo às novas tecnologias e à inovação, devido à extrema pobreza e a desigualdade de renda existente entre os cidadãos, além de um desenvolvimento tardio em sua economia local. Dessa forma, repensar e reformular a tributação atual, visando adequar-se à economia digital, poderá proporcionar aos Estados uma arrecadação mais eficiente e justa para a sua população. Pensando nestas acepções, esta obra foi construída em torno do propósito de debater e aprofundar os temas envolvendo a economia digital e a tributação. O primeiro capítulo, neste sentido, aborda o aprendizado de máquina e o direito fundamental do contribuinte, que busca analisar o uso da técnica do aprendizado de máquina (machine learning) no âmbito da fiscalização tributária, questionando se essa tecnologia acarreta ou acarretará riscos aos direitos fundamentais dos contribuintes, no âmbito de sua defesa, perante o poder fiscal artificial e inteligente. O segundo texto trata sobre os impactos do julgamento do STF sobre software na tributação federal, tratando sobre a longa discussão da tributação de softwares padronizados (ou “de prateleira”), referente ao ICMS e ao ISS, em seu estado atual, e seus reflexos importantes na tributação federal. O terceiro capítulo concentra-se nas perspectivas tributárias na era digital: uma análise crítica sobre a tributação brasileira após a EC/132, analisando os reflexos das novas tecnologias ao sistema tributário nacional diante das propostas de reforma fiscal, especialmente em face da Emenda Constitucional no 132, de 20 de dezembro de 2023, a fim de verificar se a tributação pode ser um instrumento de redução de desigualdade de renda e de concretização dos direitos fundamentais ao cidadão, como também um estímulo à evolução da nova era digital. Na sequência, o quarto capítulo busca ofertar um conceito de receita adequa- da para a economia de plataforma. O quinto texto trata da sujeição passiva das plataformas digitais no âmbito da reforma tributária, enfatizando sobre os possíveis limites sistêmicos a inclusão das plataformas digitais como su- jeitos passivos do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), especialmente após a Reforma Tributária, que permitiu tal possibilidade no art. art.156-A §3o da Constituição Federal. O sexto texto desta obra retrata a responsabilidade tributária dos marketplaces pelo recolhimento de ICMS em plena economia digital, ponderando sobre as diretivas da União Europeia e os principais estudos e recomendações da OCDE sobre o tema de responsabilidade, bem como analisando a atribuição de responsabilidade na legislação tributária brasileira, visando responder se o atual sistema jurídico tributário pode atribuir a responsabilidade pelo recolhimento do ICMS às plataformas digitais de marketplace. No capítulo seguinte, será debatido sobre os impactos regulatórios e fiscais nas plataformas de crowdfunding, que estão emergindo como um mecanismo disruptivo de financiamento coletivo, permitindo que projetos e ideias en- contrem apoio financeiro direto de uma comunidade diversificada de investi- dores. No entanto, essa modalidade de financiamento, apesar de seu potencial transformador, encontra-se em uma área cinzenta em termos de regulamen- tação e tributação, especialmente no que tange à aplicação do Imposto Sobre Serviços, debate este que será aprofundado no referido capítulo. O texto a incidência de imposto de renda sobre criptomoedas: da sua na- tureza camaleônica à efetiva incidência tributária discute sobre a tributação das criptomoedas, especialmente quanto à incidência do Imposto de Renda sobre estes ativos. No próximo capítulo, a obra contempla a temática dos criptoativos e tributação da permuta: swaps, atomic swaps e wrapped tokens, discutindo sobre a legitimidade e a adequação da incidência de imposto de renda sobre operações de permuta de criptoativos (“cripto-cripto), haja vista que transcende questões dogmáticas relativas à fixação dos limites da materialidade do imposto de renda e a conformação da Constituição Federal como sendo um diploma tipológico ou conceitual na repartição de competências tributárias. Por derradeiro, o último capítulo trata sobre a análise econômica do direito e responsabilidade civil das plataformas por conteúdo gerado por terceiro: o marco civil da internet promove mitigação de custos de transação? Neste texto, refletir-se-á sobre os impactos no campo econômico, com o advento e aplicação do Marco Civil da Internet, tratando sobre o papel atribuído pela regulação ao Poder Judiciário. visando sopesar sobre os avanços e desvanta- gens da solução legislativa, a partir de uma visão teórico-normativa, respon- dendo se “o Marco Civil da Internet (MCI) promove a mitigação dos custos de transação?”. O amplo espectro de temáticas abordadas nos capítulos reforça a importância e o alcance da obra conjunta para o esclarecimento e aprofundamento do tema sobre a tributação frente a economia digital, revelando uma variedade extensa de repercussões no âmbito legislativo fiscal, como também na esfera social econômica. Neste viés, destaca-se que a obra é
Se o metaverso imita a vida, a mesma premissa vale em relação à tributação?
Como é a tributação no metaverso? por EDERSON PORTO e MARINA COSTA O metaverso é um espaço virtual compartilhado, capaz de inserir pessoas e coisas do mundo real para o mundo digital. A finalidade do ambiente é misturar e contemplar ambos os universos, utilizando de recursos tecnológicos de modo a possibilitar experiências personalizadas.[1] Em que pese se tratar de um fenômeno atual, o metaverso não é uma novidade. O termo teve origem na ficção científica há 30 anos, em 1992, na obra Snow Crash (Nevasca), de Neal Stephenson. Apesar do aludido conceito ter sido explorado intensamente em filmes de ficção como Matrix e Jogador no 1, a evolução tecnológica da era digital nas últimas décadas foi, gradativamente, criando a infraestrutura para o metaverso se desenvolver e passar da ficção para a realidade.[2] Assim, à medida que o metaverso foi sendo desenvolvido, mais popular e presente em nosso cotidiano se torna. Como se trata de uma realidade virtual que emula um “mundo paralelo”, não tardou para que as pessoas vislumbrassem oportunidade e passassem a oferecer produtos e serviços por lá. Nessa realidade virtual podem ocorrer a realização de diversas operações financeiras, comercializações de imóveis virtuais, transações de serviços, compra e venda de produtos, dentre outras transações. Uma das indagações que surge é: como funciona a tributação no metaverso? Estima-se que, no ano de 2021, quase U$$ 2 bilhões foram investidos em lotes de terra virtuais no metaverso. Com base nesse exemplo, o mundo corporativo e especuladores, apostam que em breve viveremos parte de nossas vidas na realidade virtual.[3] Apesar de não existir uma legislação a respeito da tributação no metaverso, a Receita Federal vem estudando a sua regulamentação. É possível identificar pronunciamentos da Receita que podem nos dar uma pista do que está por vir. É o caso, por exemplo, da Solução de Consulta 214/21[4], no qual foi adotado o posicionamento de que transações realizadas no universo digital relacionadas a criptomoedas devem ser objeto de tributação pelas regras gerais do IRPF. No mesmo sentido, é possível invocar as disposições da Instrução Normativa 1.888/19[5], a qual buscou regulamentar a intermediação na compra e venda de criptomoedas, definindo algumas diretrizes para a compra de bens por meio de criptoativos. Contudo, esta normatização não abordou como fica a questão em relação ao metaverso. Porém, é possível dizer que Solução de Consulta e Instrução Normativa criam hipótese de incidência? Certo que não! E como interpreta o Poder Judiciário? O Supremo Tribunal Federal (STF) já apresentou posicionamento sobre alguns serviços digitais[6] ao julgar a ADI 5.659 e fixou orientação para a tributação de alguns negócios digitais[7]. Em seu voto, o Ministro Dias Toffoli sinaliza que “A tradicional distinção entre software de prateleira (padronizado) e por encomenda (personalizado) não é mais suficiente para a definição da competência para a tributação dos negócios jurídicos que envolvam programas de computador em suas diversas modalidades. Diversos precedentes da Corte têm superado a velha dicotomia entre obrigação de fazer e obrigação de dar, notadamente nos contratos tidos por complexos (v.g. leasing financeiro, contratos de franquia)”. Curioso que o voto retorna à distinção entre obrigação de fazer e destaca a prevalência de um agir humano para reconhecer a incidência do ISS. Trilhando um caminho perigoso, o Supremo passou a ampliar a competência tributária do ISS, fazendo incidir a tributação sobre negócios jurídicos que não se encontravam ao alcance da norma tributária. Pode-se dizer que o STF deu um péssimo sinal que, sem dúvida alguma, será bem explorado pelos entes tributantes. De qualquer modo, não se pode dizer que a questão está resolvida. É possível identificar alguns temas que devem ser muito debatidos nos próximos anos, especialmente, em relação à tributação de operações e transações financeiras no metaverso. Em relação às criptomoedas, há uma maior clareza sobre a tributação, uma vez que a RFB já se posicionou sobre o assunto na Instrução Normatival n° 1.888/2019. O contribuinte que detém criptomoedas tem o dever de declarar e recolher IR sobre ganho de capital na hipótese de alienação com lucro. Importante lembrar que muitas plataformas no metaverso tomam as criptomoedas como forma de pagamento.[8] Nesse cenário, os pagamentos podem ser feitos não apenas em criptomoedas. Os NFT (tokens não fungíveis) diferenciam-se bastante das criptomoedas, pois são o resultado de uma operação econômica que revela a propriedade de um determinado bem digital. Os tokens não fungíveis são, portanto, representações digitais de qualquer coisa digital única, como obras de arte digitais. No entanto, persiste a dúvida se NFT é um criptoativo nos termos que a RFB entende. [9] Dúvidas surgem sobre o tratamento que deve ser dispensado às operações ocorridas no metaverso. O primeiro dilema consiste em definir a jurisdição. Uma transação realizada no metaverso considera-se ocorrida no Brasil? Se não for reconhecida a transação no Brasil, poderia a tributação alcançar um evento ocorrido no exterior? Em razão do princípio da soberania, respeitado no plano internacional, não poderia uma nação soberana tributar fato econômico ocorrido em território de outra nação soberana. Daí porque nunca se questionou ou controverteu a incidência de tributos no mundo off-line. Ressalva seja feita para a tributação da renda que há muito vem superando o princípio da territorialidade, valendo lembrar que o Brasil adotada, desde 1995, o princípio da tributação em bases universais o que significa que a legislação tributária poderá alcançar eventos econômicos ocorridos fora do território nacional. É como dispõe o Regulamento do Imposto de Renda (Decreto n° 9.580/2018): Art. 47. São também tributáveis ( Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 6º, caput, e alínea “c” , art. 8º, caput, e alínea “e” , e art. 10, § 1º, alíneas “a” e “c” ; Lei nº 4.506, de 1964, art. 26 ; Lei nº 5.172, de 1966 – Código Tributário Nacional, art. 43, § 1º ; Lei nº 7.713, de 1988, art. 3º, § 4º ; e Lei nº 9.430, de 1996, art. 24, § 2º, inciso IV , e art. 70, § 3º, inciso I ):(..)VII – os rendimentos recebidos no exterior, transferidos ou não para o País, decorrentes de atividade desenvolvida ou de