por Éderson Porto e Artur Schmitz
O consumo de produtos e especialmente de comida passa pela intermediação de grandes plataformas que aproximam o restaurante do consumidor. Dentro de um aplicativo é possível escolher uma variedade de tipos e preços de comidas. Para viabilizar a transação, as plataformas exigem das partes uma comissão que é repassada ao preço do pedido ao consumidor.
Os aplicativos de entrega cobram e retêm uma taxa que varia de 12 a 30% do valor do pedido, fruto da sua intermediação entre o estabelecimento e o comprador. O ponto importante é que o valor não pertence ao restaurante. Muitas plataformas já fazem o que se chama de “split” e faturam em separado a comissão e o valor da refeição. No entanto, algumas plataformas geram faturas com o valor bruto e isso gera muita confusão.
A Receita Federal publicou Solução de Consulta COSIT n° 170/2021 que define como receita passível de tributação pela IRPF, CSLL, PIS e COFINS o preço do serviço cobrado pelo market place e não o valor integral pago pelo consumidor:
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ BASE DE CÁLCULO. RECEITA BRUTA. PREÇO DO SERVIÇO. A receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, no caso de prestação de serviços, corresponde ao preço do serviço. Não se incluem no conceito de receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, os valores que circulam na contabilidade de pessoa jurídica e não lhe pertencem, sendo propriedade e receita bruta de terceiros.
Dispositivos Legais: Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12; Anexo do Decreto nº 9.580, de 2018, art. 208; e Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 2017, art. 26.
Assunto: Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL BASE DE CÁLCULO. RECEITA BRUTA. PREÇO DO SERVIÇO. A receita bruta, para fins do art. 2º da Lei nº 7.689, de 1988, combinado com o art. 26 da Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 2017, no caso de prestação de serviços, corresponde ao preço do serviço. Não se incluem no conceito de receita bruta de que trata o art. 26 da Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 2017, os valores que circulam na contabilidade de pessoa jurídica e não lhe pertencem, sendo propriedade e receita bruta de terceiros.
Dispositivos Legais: Lei nº 7.689, de 1988, art. 2º; e Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 2017, art. 26.
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins BASE DE CÁLCULO. RECEITA BRUTA. PREÇO DO SERVIÇO. A receita bruta, para fins do art. 1º, §1º da Lei nº 10.833, de 2003, no caso de prestação de serviços, corresponde ao preço do serviço. Não se incluem no conceito de receita bruta, para fins do art. 1º, §1º da Lei nº 10.833, de 2003, os valores que circulam na contabilidade de pessoa jurídica e não lhe pertencem, sendo propriedade e receita bruta de terceiros.
Dispositivos Legais: Lei nº 10.833, de 2003, art. 1º, §1º; e Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12.
Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep BASE DE CÁLCULO. RECEITA BRUTA. PREÇO DO SERVIÇO.
A receita bruta, para fins do art. 1º, §1º da Lei nº 10.637, de 2002, no caso de prestação de serviços, corresponde ao preço do serviço. Não se incluem no conceito de receita bruta, para fins do art. 1º, §1º da Lei nº 10.637, de 2002, os valores que circulam na contabilidade de pessoa jurídica e não lhe pertencem, sendo propriedade e receita bruta de terceiros.
Dispositivos Legais: Lei nº 10.637, de 2002, art. 1º, §1º; e Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12.
Além disso, pode-se dizer que o montante retido não faz parte do faturamento da empresa, podendo ser equiparado, inclusive, a um insumo, uma vez que é imprescindível para a atividade da empresa, conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015 (…) 2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. (…) (REsp n. 1.221.170/PR, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 22/2/2018, DJe de 24/4/2018.)
Não obstante, alguns contribuintes sofrem autuações equivocadas, o que acabam gerando discussões perante o Poder Judiciário.
Tendo em vista este panorama, alguns estabelecimentos impetraram Mandados de Segurança buscando que o Fisco cessasse esta absurda exigência. E o Poder Judiciário vem dando razão aos contribuintes, como demonstrado no Processo Nº 1048374-15.2021.4.01.3400, oriundo do Tribunal Regional Federal da 1ª Região:
(…) os valores pagos às plataformas digitais de delivery a título de “taxa de intermediação” não integram o faturamento da empresa, uma vez que se reveste na sua própria atividade ao intermediar serviços de pagamento, conforme elencado acima.
Assim, os serviços indicados a título de taxa de intermediação pela impetrante tem natureza de insumo e, desta forma, geram direito de aproveitamento de crédito de PIS e COFINS na modalidade não-cumulativa.
Diante de todo o exposto, CONCEDO a segurança para declarar a ilegalidade da inclusão dos valores pagos às plataformas digitais de delivery a título de “taxa de intermediação” para compor a base de cálculo do PIS e da COFINS, assegurada a compensação e/ou restituição das parcelas não tragadas pela prescrição e pela data fixada na modulação dos efeitos da decisão do STF, nos termos da fundamentação acima, ressalvado à Administração o direito de fiscalizar a liquidez e certeza dos créditos compensáveis.
No mesmo sentido, também houve recente decisão proferida pelo Magistrado José Arthur Diniz Borges da 8ª Vara Federal do Rio de Janeiro (processo tramitando sob o Nº 5003370-24.2023.4.02.5101/RJ):
“ (…) Assim, uma vez que a impetrante é empresa do ramo alimentício e que é flagrante que se utilize de plataformas digitais para impulsionamento de suas vendas, o valor pertinente a “comissão” paga a tais empresas, cujo valor nem sequer entre na composição em seu caixa, é certo que tenha a natureza de insumo e, portanto, deve ser excluída da base de cálculo das contribuições.
Dispositivo
Diante de todo o exposto, CONFIRMO A LIMINAR E CONCEDO A SEGURANÇA para determinar que a autoridade impetrada assegure a impetrante o direito de excluir da base de cálculo das contribuições para o PIS e COFINS o percentual pertinente a comissão relativa a plataforma digital de entregas (delivery).
Outrossim, declaro o direito da impetrante de COMPENSAR/RESTITUIR os valores indevidamente recolhidos nessa sistemática (Súmula nº 461 do STJ), na forma estabelecida na legislação de regência, após o trânsito em julgado da decisão (art. 170-A do CTN), observado o prazo de cinco anos (art. 168 do CTN), ficando a operação sujeita ao regramento da Secretaria da Receita Federal do Brasil. Sobre os créditos apurados pela impetrante, incidirá a Taxa SELIC, com exclusão de qualquer outro índice de juros e de correção monetária.”
Como a utilização de plataformas de intermediação é um fenômeno recente, ainda é possível observar muita dúvida e confusão. Pensando em ajudar, escrevemos este artigo. É importante ficar atento para o correto tratamento das receitas sob pena de se estar tributando valores equivocados.